" Caminhávamos juntos e separados entre os desvios bruscos da floresta. Nossos passos, que era o alheio de nós, iam unidos, porque uníssonos, na macieza estalante das folhas, que juncavam , amarelas e meio-verdes, a irregularidade do chão. Mas iam também disjuntos porque éramos dois pensamentos, nem havia entre nós de comum senão que o que não éramos pisava uníssono o mesmo solo ouvido.
Tinha entrado já o princípo do outono, e, além das folhas que pisávamos, ouvíamos cair continuamente, no acompanhamento brusco do vento, outras folhas, ou sons de folhas, por toda a parte onde íamos ou havíamos ido. Não havia mais paisagem senão floresta que velava todas. Bastava,porém, como sítio e lugar para os que, como nós, não tíhamos por vida senão caminhar uníssono e diverso sobre um solo mortiço. Era - creio- o fim de um dia, ou de qualquer dia, ou porventura de todos os dias, nem outono todos os outonos, na floresta simbólica e verdadeira.
Que casas, que deveres, que amores havíamos largado - nós mesmos o não saberíamos dizer. Não éramos , nesse momento, mais que caminhantes entre o que esquêceramos e o que não sabíamos, cavaleiros a pé do ideal abandonado. Mas nisso, como no som constante das folhas pisadas, e no som sempre brusco do vento incerto, estava a razão de ser a nossa ida, ou da nossa vinda, pois, não sabendo o caminho ou porque o caminho, não sabíamos se partíamos se chagávamos. E sempre, em torno nosso, sem lugar sabido ou queda vista, o som das folhas que scombravam adormecia da tristeza a floresta."