Resto/448b

" O chegar, porém, a este grau de sensação, acarreta ao amador de sensações o correspondente peso ou gravame físico de que correspondentemente sente, com idêntico exaspero consciente, o que de doloroso impinge do exterior, e por vezes do interior também, sobre o seu momento de atenção. É quando assim constata que sentir excessivamente, se por vezes é gozar em excesso, é outras sofrer com prolixidade, e porque o constata, que o sonhador é levado a dar o segundo passo na sua ascensão para si próprio.
Ponho de parte o passo que ele poderá ou não dar, e que, consoante ele o possa ou não dar, determinará tal ou tal outra atitude, jeito de marcha, nos passos que vai dando, segundo possa ou não isolar-se por completo da vida real (se é rico ou não – redunda nisso). Porque suponho compreendido nas entrelinhas do que narro que, consoante e ou não possível ao sonhador isolar-se e dar-se a si, com menor ou maior intensidade ele deve concentrar-se sobre a sua obra de despertar doentiamente o funcionamento das suas sensações das coisas e dos sonhos. Quem tem de viver entre os homens, activamente e encontrando-os – e é realmente possível reduzir ao mínimo a intimidade que se tem de ter com eles (a intimidade, e não o mero contacto, com gente, é que é o prejudicador) –, terá de fazer gelar toda a sua superfície de
convivência para que todo o gesto fraternal e social feito a ele escorregue e não entre ou não se imprima.
Parece muito isto, mas é pouco. Os homens são fáceis de afastar: basta não nos aproximarmos. Enfim, passo sobre este ponto e reintegro-me no que explicava."