" Não sei porquê - noto-o subitamente - estou sozinho no escritório.
Já, indefinidamente, o pressentira. Havia em qualquer aspecto da minha cosciência de mim uma amplitude de alívio, um respirar mais fundo de pulmões diversos.
É esta uma das mais curiosas sensações que nos poder ser dada pelo acaso dos encontros e das faltas: a de estarmos sós numa casa ordinariamente cheia, ruidosa ou alheia. Temos,de repente, uma sensação de posse absoluta, de domínio fácil e largo, de amplitude - como disse - de alívio e sossego.
Que bom estar só largamente! Poder falar alto connosco, passear sem estorvo de vistas, reposar para trás num devaneio sem chamamento! Toda a casa se torna campo, toda a sala tem a extensão de uma quinta.
Os ruídos são todos alheios, como se pertencessem a um universo próximo mas independente. Somos, finalmente, reis. A isso todos aspiramos, enfim, e os mais plebeus de nós - quem sabe - com maior vigor que os de mais ouro falso. Por um momento somos pensionistas
do universo, e vivemos, regulares do soldo dado, sem necessidade nem preocupações.
Ah, mas reconheço, naquele passo na escada, subindo até mim não sei quem, o alguém que vai interromper a minha solidão espairecida. Vai ser invadido pelos bárbaros o meu império implícito. Não é que o passo me diga quem é que vem, nem que me lembre o passo deste ou daquele que eu conheça. Há um mais surdo instinto da alma que me faz saber que é para aqui que vem o que sobe, por enquanto só passos, na escada que subitamente vejo, porque penso nele que a sobe. Sim, é um dos empregados..."