Resto 206/a

" Sim, é poente. Chego à foz da Rua da Alfândega, vagaroso e disperso,e, ao clarear-me o Terreiro do Paço, vejo nítido, o sem sol do céu ocidental. Esse céu é de um azul esverdeado para cinzento branco, onde, do lado esquerdo, sobre os montes da outra margem, se agacha, amontoada, uma névoa acastanhada de cor-de-rosa morto. Há uma grande paz que não tenho dispersa friamente no ar outonal abstracto. Sofro de a não ter o prazer vago de supor que ela existe. Mas, na realidade, não há paz nem falta de paz:céu apenas, céu de todas as cores que desmaiam - azul branco, verde ainda azulado, cinzento pálido entre verde e azul, vagos tons remotos de cores de nuvens que o não são, amareladamente escurecidas de encarnado findo. E tudo isto é uma visão que se extingue no mesmo momento em que é tida, um intervalo entre nada e nada, alado, posto alto, em tonalidades de céu e mágoa, prolixo e indefinido.
Sinto e esqueço. Uma saudade, que é a de toda a gente por tudo, invade-me como um ópio do ar frio. Há em mim êxtase de ver, íntimo e postiço."