Resto 74/b

" Vista de perto; toda a gente é monotonamente diversa.Dizia Vieira que Frei Luís de Sousa escrevia "o comum com singularidade".Esta gente é singular com comunidade, às avessas do estilo da Vida do Arcebispo. Tudo isto me faz pena,sendo-me todavia indiferente.Vim parar aqui sem razão,como tudo na vida.
Do lado do oriente,entrevista,a cidade ergue-se quase  a  prumo  falso, assalta estaticamente o Castelo.O sol pálido molha de um aureolar vago essa mole súbita de casas que para aqui o oculta.O céu é de um azul humidamente esbranquiçado.A chuva de ontem talvez se repita hoje,mas mais branda.O vento parece leste, talvez porque aqui mesmo,de repente, cheira vagamente ao maduro  e  verde  do  mercado  próximo.Do lado oriental da Praça há mais forasteiros que do outro.Como descargas alcatifadas, as portas onduladas descem para cima; não sei porquê, é assim a frase que me transmite aquele som.
É talvez porque fazem mais esse som ao descer, porém agora  sobem.Tudo se explica.
De repente estou só no mundo. Vejo tudo isto do alto de um telhado espiritual. Estou só no mundo. Ver é estar distante.Ver claro é parar. Analisar é ser estrangeiro. Toda a gente passa sem roçar por mim. Tenho só ar à minha volta. Sinto-me tão isolado que sinto a distância entre mim e o meu fato. Sou uma criança, com uma palmatória mal acesa, que atravessa, de camisa de noite, uma grande casa deserta. Vivem sombras que me cercam - só sombras, filhas dos móveis hirtos e da luz que me acompanha.
Elas me rondam aqui ao sol, mas são gente."