" Quantas vezes, contudo, em pleno meio desta insatisfação sossegada,me não sobe pouco a pouco à emoção consciente o sentimento do vácuo e do tédio de pensar assim" Quantas vezes não me sinto, como quem ouve falar através de sons que cessam e recomeçam, a amargura essencial desta vida estranha à vida humana - vida em que nada se passa salvo na consciência dela! Quantas vezes, despertando de mim, não entrevejo, do exílio que sou, quanto fora melhor ser o ninguém de todos, o feliz que tem ao menos a amargura real, o contente que tem cansaço em vez de tédio, que sofre em vez de supor que sofre, que se mata, sim em vez de se morrer!
Tornei-me uma figura de livro, uma vida lida. O que sinto é (sem que eu queira) sentido para se escrever que se sentiu. O que penso está logo em palavras, misturado com imagens que o desfazem, aberto em ritmos que são outra coisa qualquer. De tanto recompor-me, detruí-me. De tanto pensar-me, sou já meus pensamentos mas não eu. Sondei-me e deixei cair a sonda;vivo a pensar se sou fundo ou não, sem outra sonda agora senão o olhar que me mostra, claro e negro no espelho do poço alto, meu próprio rosto que me contempla contemplá-lo."