"...Achei sempre que a virtude estava em obter o que não se alcançava, em viver onde se não está, em ser mais vivo depois de morto que quando se está vivo, em conseguir, enfim, qualquer coisa de difícil, de absurdo, em vencer, como obstáculo, a própria realidade do mundo.
Se me disserem que é nulo o prazer de durar depois de não existir, reponderei, primeiro, que não sei se o é ou não, pois não sei a verdade sobre a sobrevivência humana; responderei, depois, que o prazer da fama futura é um prazer presente - a fama é que é futura. E é um prazer de orgulho igual a nenhum que qualquer possa material consiga dar. Pode ser, de facto, ilusório, mas seja o que for, é mais largo do que o prazer de gozar só o que está aqui.O milionário americano não pode crer que a posteridade aprecie os seus poemas, visto que não escreveu nenhuns...Eu, porém, que na vida transitória não sou nada, posso gozar a visão do futuro a ler esta página, pois efectivamente a escrevo; posso orgulhar-me, como de um filho, da fama que terei, porque, ao menos, tenho com que a ter. E quando penso isto, erguendo-me da mesa, é com uma íntima majestade que a minha estatura invisível se ergue acima de Detrot,Michigan, e de toda a praça de Lisboa.Reparo,porém,que não foi com estas reflexões que comecei a reflectir.O que pensei logo foi no pouco que tem que ser na vida quem tem que sobreviver.Tanto faz um reflexão como a outra,pois são a mesma.A glória não é uma medalha, mas uma moeda:de um lado tem a figura,do outro uma indicação de valor.Para os valores maiores não há moeda:são de papel e esse valor é sempre pouco.
Com esta psicologias metafísicas se consolam os humildes como eu"