" Mas daquela vez em que a malícia da oportunidade me fez julgar que amava,...fiquei, primeiro estonteado e confuso...como se me saíra uma sorte grande em moeda inconvertível. Fiquei, depois, porque niguém é humano sem o ser, levemente envaidecido; esta emoção, porém, que paraceria a mais natural, passou rapidamente. Sucedeu-se um sentimento difícil de definir, mas em que se salientavam incomodamente as sensações de tédio, de humilhação e de fadiga.
De tédio, como se o Destino me houvesse imposto uma tarefa em serões desconhecidos. De tédio, como se um novo dever - o de uma horrorosa reciprocidade - me fosse dado com a ironia de um privilégio, que eu me teria ainda que maçar, agradecendo-o ao Destino. De tédio, como se me não bastasse a monotonia inconsistente da vida, para agora se lhe sobrepor a monotonia obrigatória de um sentimento definido. E de humilhação, sim, de humilhação. Tardei em perceber a que vinha um sentimento aparentemente tão pouco justificado pela sua causa. O amor a ser amado deveria ter-me aparecido. Deveria ter-me envaidecido de alguém reparar atentamente para a minha existência como ser-amável. Mas ,à parte o breve momento de real envaidecimento, em que todavia não sei se o pasmo teve mais parte que a própria vaidade, a humilhação foi a sensação que recebi de mim. Senti que me era dada uma espécie de prémio destinado a outrem - prémio, sim, de valia para quem naturalmente o merecesse."